1. |
Travessia
04:03
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As águas negras do oceano
se abrem à sua frente
No seu encalço a raiva cega
de todo um continente
Você quer se salvar e segue adiante
Mas o céu jamais esteve tão distante
Você avança lentamente
pisando nos corais
Em volta brilham curiosos
os olhos abissais
Você quer se salvar e segue adiante
Mas o céu jamais esteve tão distante
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2. |
Parto normal
02:38
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O lençol na cabeça
o travesseiro nos pés
O ponteiro pequeno no oito
o grande quase chegando no dez
O sol na janela
o café na cozinha
Os gatos brincando na sala
a sua boca colada na minha
O dia nasceu de parto normal
E não importa a cara que ele vai ter
A gente vai gostar dele igual
As flores no espelho
os quadros no chão
Os livros embaixo da cama
o Zé Colmeia na televisão
O calor do seu colo
o barulho da rua
A última cena de um sonho
a minha boca colada na sua
O dia nasceu de parto normal
E não importa a cara que ele vai ter
A gente vai gostar dele igual
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3. |
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Mordida de urso dói
Fumar dinamite dói
Brincar bem bonzinho não dói
mas também não tem graça
Levar chinelada machuca o orgulho
Ficar de castigo detona o juízo
Deitar sem jantar dá fraqueza
mas dorme que passa
Ser catapultado dói
Cair do penhasco dói
Tocar violino não dói
mas também não tem graça
Levar chinelada machuca o orgulho
Ficar de castigo detona o juízo
Deitar sem jantar dá fraqueza
mas dorme que passa
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4. |
Tudo é memória
02:32
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Os bolsos vazios
ficaram pesados demais
A barba mal-feita
não tem mais o charme
de tempos atrás
Ele dorme e acorda cansado
de esperar pelos dias de glória
Ele não quer viver do passado
mas esquece que tudo é memória
Os sonhos antigos
são nuvens que o vento desfaz
As dores e os discos
dos velhos amigos
são todos iguais
Ele dorme e acorda cansado
de esperar pelos dias de glória
Ele não quer viver do passado
mas esquece que tudo é memória
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5. |
Dom desnecessário
03:35
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Ela põe os olhos em você
e já sabe como vai acontecer:
aneurisma queda de avião
suicídio câncer de pulmão
Mas pouca gente acredita
mesmo que seja uma premonição bonita:
gesto heróico foto nos jornais
flores brancas honras marciais
Algum dia ela vai entender
que possui um dom desnecessário
Em terra de cego ela vai ver
que quem tem um olho é solitário
Ela só não pode aceitar
o seu próprio fim como será:
a cidade em festa a noite inteira
e um corpo ardendo na fogueira
Algum dia ela vai entender
que possui um dom desnecessário
Em terra de cego ela vai ver
que quem tem um olho é solitário
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6. |
Aos abutres
05:03
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Dormir como homem de bem
e acordar como fora-da-lei
De manhã mendigar o almoço
e à noite jantar como um rei
Entregar as entranhas aos homens
e aos abutres o fogo de Zeus
Jogar bola no clube dos nobres
e gamão no covil dos plebeus
Construir um castelo de ouro
e morar de favor num bordel
Escrever um postal suicida
e apagar as estrelas do céu
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7. |
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Entrou na vida tropeçando
no cordão umbilical
E vai seguir desgovernado
até a queda no final
Mas ele nunca se lamenta
desse eterno inferno astral
Porque a sorte é traiçoeira
mas o azar – esse é leal
O seu diário é uma mistura
de esculhambação e caos
Quando o destino dá as cartas
sempre tira o dois de paus
Mas ele nunca se lamenta
desse eterno inferno astral
Porque a sorte é traiçoeira
mas o azar – esse é leal
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8. |
Eternidades ocasionais
02:59
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Talvez eu sentisse
saudades de mim
se eu me lembrasse
do cara que eu era
ainda fora da cela
de um impasse
Talvez se eu parasse
de olhar o futuro
pelo avesso
o acaso aceitasse
afinal esboçar
um recomeço
Meus dias são eternidades ocasionais
Ontem já faz muito tempo
Amanhã sempre é tarde demais
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9. |
Nas nuvens
02:45
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Preso nas ferragens
de um engarrafamento
Abrindo os olhos
pra sonhar e vendo
o dia derreter
na chapa quente da avenida
É assim que eu jogo fora a minha vida
Deixando as coisas mais urgentes
sempre pra depois
e o resto
lá pro dia trinta e dois
Adivinhando em nuvens
outras nuvens escondidas
É assim que eu jogo fora a minha vida
Tentando agradar
quem não se importa
e dando a quem se importa
muito pouco
de uma atenção
que é tão mais merecida
É assim que eu jogo fora a minha vida
Adivinhando em nuvens
outras nuvens escondidas
É assim que eu jogo fora a minha vida
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10. |
Elevação
03:11
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Aperta o botão. Espera.
Abre a porta, olha o degrau
da caixa vermelha e fatal
como a boca de uma fera.
Escolhe o número tal
do andar do apartamento
do prédio espetado no centro
da sua cidade natal.
Faz silêncio e fica atento
ao barulho da polia,
ao cabo que se desfia
e assobia como o vento.
Recita a Ave-Maria,
que esse elevador antigo
não calculou o perigo
de chegar onde queria.
Era o seu último abrigo.
Atravessa o corredor,
tira do bolso o rancor,
fecha a porta e vem comigo.
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11. |
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Não tem mais graça no milagre
e nem mistério na ciência
Não sobra espaço pro vazio
Não tem mais vagas pra ausência
Quase tudo faz sentido
mas não tem importância
Todo mundo está tão perto
e eu com saudade da distância
Não há ouvidos pro silêncio
Não tem suor no meu cansaço
Preste atenção no que eu não digo
Imite tudo o que eu não faço
Quase tudo faz sentido
mas não tem importância
Todo mundo está tão perto
e eu com saudade da distância
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Lestics São Paulo, Brazil
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